26 fevereiro 2006

Quer fazer Deus rir? Faça planos.

Meu plano era ir para um certo estágio no exterior, mas isso foi tirado de mim. Meu plano era "viver felizes para sempre", mas quando um não quer, dois não permanecem casados. Meu plano era tirar umas férias depois de minha viagem à Antártica em um veleiro dobrando o Cabo Horn, mas terei que postergar isso.

Agora que é oficial, posso falar abertamente, ao invés de ficar deixando dicas subliminares no blog (O mundo muda. A gente muda...). No dia 13/2, quando estava em Punta Arenas prestes a embarcar para a Antártica, o Instituto Rio Branco me ofereceu uma das vagas para estudar no Instituto del Servicio Exterior de la Nación, Isen, a academia diplomática argentina.

Graças ao link via satélite de Ferraz, pude entrar no circuito - seria tragicamente engraçado voltar ao Brasil e descobrir que fui preterido porque não pude ser contatado. Com a ajuda dos amigos (obrigado a todos), esclareci que poderia sim me apresentar em Buenos Aires na data exigida, 1º de março, quarta-feira de cinzas, bastaria mudar minha passagem e abrir mão de meus planos de férias (o que não foi feito sem dor).

Obtido o aval da chefia, passei ainda alguns dias em ansioso suspense por uma confirmação oficial, que chegou finalmente na tarde da última sexta-feira, véspera de Carnaval. Nesse tempo todo postando, estive tenso, com a cabeça em BSB e BsAs e os pés aqui. Em algumas poucas horas embarco em um avião a caminho de Buenos Aires, onde antes de ir para algum hotel o taxista vai me levar para comprar um terno, uma gravata e um par de sapatos, pois só levo comigo meu mochilão austral.

Tudo ocorreu tão rápido, confesso que estou com frio na barriga. Tenho calafrios só de imaginar o que me espera para organizar minha mudança à distância. Não sei se foi a decisão correta, mas sei que, fosse qual fosse, eu ficaria imaginando a alternativa..."e se?". Foi uma decisão complicada porque não queria sair nessas condições, quase um fugitivo, de onde estou trabalhando agora, mas me pareceu uma oportunidade boa demais para deixar passar e, felizmente, minha chefa compreendeu isso (adoro essa mulher).

Abracei a mudança. Vocês não fazem idéia de como estou feliz aqui, eu só lamento não poder dividir este momento de forma apropriada com meus amigos. Eu preferia contar isso tudo pessoalmente, de preferência em meio a alguns chopps no Bar Brasília, ou pelo menos por email, individualmente, mas parti de BSB sem minha agenda de contatos e não sei quando terei oportunidade de retornar ao cerrado. Espalhem a notícia por favor, abraços e beijos a todos, e tomem umas por mim. Assim que eu tiver um endereço e un teléfono, vocês serão devidamente informados.

Bom Carnaval para vocês, o Explorador vai levar sua rede para Buenos Aires.


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Estamos prestes a entrar no terceiro mês de 2006. Me diverti saindo todas as noites de janeiro - caí na putaria, caí de beber e caí de amores. Em fevereiro, fiz uma viagem para a Antártica, minha obsessão, encarei uma travessia pela Passagem do Drake e fui até o Fim do Mundo, a Terra do Fogo. Em março, começo a viver em Buenos Aires. Só falta o Santos ser campeão.

Tudo conspirou a meu favor, mesmo meus momentos mais difíceis... Assim acabarei virando um fatalista, que será, será....Talvez eu tenha mesmo nascido virado para a Lua, como diz minha tia. Ou talvez tanta coisa boa seja alguma forma de compensação cósmica pela sacanagem que me foi feita em 2005. Se for o caso, já está pago, com juros - e quem saiu no lucro nessa história certamente fui eu.

Quem sabe, talvez eu até vá agradecer a falecida...

25 fevereiro 2006

Dia 14. Museus. Trem do Fim do Mundo. Parque Nacional.

Passei o resto do dia anterior zanzando pela cidade, perdido de propósito. Cheguei a uma parte da cidade nada charmosa, que provavelmente só nao é uma favela porque o pessoal morreria de frio.

O ponto alto foi a descoberta, indicaçao do oráculo Lonely Planet, de uma livraria especializada em livros e DVDs sobre exploraçao antártica...doeu no bolso, mas cortei alguns itens da minha wishlist da Amazon.

O ponto baixo do passeio foi na volta descobrir que Amyr Klink esteve no Ary Rongel, visitando o Comandante por algumas horas. Ele está a bordo do Nordnorge, cruzeiro antártico que partia enquanto eu recebia a notícia, perdi a oportunidade de tietar meu herói em seu próprio habitat.

Museus

Visitei o Museu do Fim do Mundo e o Museu Yagán. Lugares extremamente pequenos, dá para ver tudo em menos de 15 minutos cada, mas jeitosos. No primeiro deparei-me com uma informaçao frustrante. Em parte, a mitologia náutica em torno destas paragens e do Cabo Horn é resultado de um esquema de golpe em companhias de seguro. Com a revoluçao náutica trazida pelo vapor e, depois, pelo óleo, aproveitando-se do alto índice de naufrágios e do isolamento desta regiao, companhias de tranporte e carga mandavam seus capitaes darem sumiço nas embarcaçoes à vela em naufrágios forjados nestas bandas. Simplesmente nao havia como verificar o sinistro e o dinheiro do seguro era utilizado para renovar a flotilha. Prefiro a lenda.

Os Yagán eram os nativos da parte sul da Terra do Fogo. Ushuaia quer dizer "Baía voltada para o poente" em sua língua. Eram poucos, alguns milhares e nao deixaram muitos vestígios de sua passagem pela Terra. Nômades, nao possuíam escrita, sequer faziam pinturas rupestres (as camisetas vendidas aqui com símbolos indígenas sao de povos da Patagônia), e tudo o que se sabe deles hoje deve-se aos missionários ingleses e salesianos que primeiro se estabeleceram por aqui. Sucumbiram às doenças européias e à fome trazida pela escassez de baleias e lobos-marinhos, seu principal alimento, que por sua vez foram dizimados por baleeiros e caçadores de foca. Construíam impressionantes canoas de cortiça que as mulheres, as únicas que sabiam nadar, manejavam com destreza. Nao tinham âncoras, amarravam as canoas nas enormes algas (kelps) que crescem por aqui. Os homens cuidavam do arpao e as crianças mantinham o fogo aceso nas canoas.

Nao eram assim tao miseráveis como supôs Darwin ao ver um bando de índios gordos e pelados nessas terras frias. Nao usavam roupas (salvo um manto de pele de lobo-marinho em dias mais frios) porque roupa significa acumulo de umidade e, conseqüentemente, desconforto. Era muito mais fácil manter-se aquecido e impermeável cobrindo o corpo de gordura e ficando perto do fogo.

O fogo era elemento constante e vital na cultura Yagán. Mantinham alguma brasa sempre acesa, mesmo em suas canoas, para aquecimento e para evitar o trabalho de acender uma nova fogueira a cada parada (lembram daquele filme insuportável e onipresente nas escolas do segundo grau, "A Guerra do Fogo"?). Usavam também como forma de comunicaçao com as canoas distantes a caçar. Quando Magalhaes chegou ao extremo sul da América pela primeira vez, viu diversas dessas fogueiras, mas nao viu gente - daí Terra do Fogo.

Trem do Fim do Mundo

Você sabe que entrou em uma armidilha para turistas quando se vê cercado de aposentados e há uma gravaçao em alto-falantes com explicaçoes em japonês e coreano sobre o lugar.

Assim como Punta Arenas e Hobart, os outros pontos de entrada da Antártica, Ushuaia surgiu de uma colônia penal criada no intuito de ocupar e reivindicar estas terras para o Estado. A única forma de comunicaçao da cidade com o mundo exterior era pelo mar, mas havia uma linha férrea de 25km ligando o presídio a lugar nenhum. Todo dia, saía uma locomotiva transportando presos para cortar lenha nos bosques em torno da linha, para servir de combustível para os geradores e aquecedores do presídio e da cidade. Hoje, o presídio é uma base militar e os últimos restaurados 7Km da linha férrea sao uma armadilha para turistas, uma versao melhorada do trenzinho da finada Cidade da Criança de Sao Bernardo que percorre um bosque de tocos mortos. O jeito mais caro de entrar no Parque Nacional da Terra do Fogo.

Parque Nacional da Terra do Fogo

Fugi o mais rápido possível da armadilha e me botei a caminhar pelo parque. É uma reserva ambiental restrita, há poucas trilhas, bem demarcadas, a percorrer. Escolhi a Senda Costera, 6,5Km margeando a Baía Ensenada até quase a fronteira com o Chile, umas 3 horas de caminhada. Deu para cansar.

Trechos de bosque bastante fechado intercalados por praias de cascalho com uma vista incrível da Cordilheira ao fundo, para sentar, apreciar e refletir. O frio e a neve do inverno impedem que a matéria orgânica se decomponha completamente, em alguns trechos dá para ver que nao se está pisando em solo, mas em um enorme emaranhado do que um dia foram folhas, galhos e troncos. É como andar em um imenso xaxim, com uma generosa e grudenta camada de lama nas áreas onde a água se acumula. Estou com os joelhos doendo, mas valeu.

24 fevereiro 2006

Dia 13. Muelle Afasyn

Sendo o Fim do Mundo, Ushuaia atrai muitos viajantes hard core. Passei a manha no pier (Muelle) do clube AFASyN. Clube eh gentileza minha, ha uma casinha e um pier mal cuidado. Mas nesse pier, a maior concentracao de veleiros com mais de 40 pes que jah vi, muitos com mais de 50.

Sao cruzeiristas que escolheram a Terra do Fogo para ficar uns tempos ou gente voltando da Antartica ou em transito de suas voltas ao mundo. Dava para ouvir o pessoal conversando dentro dos navios, barulho de talheres, criancas brincando - verdadeiros lares flutuantes. Troquei uma ideia com uns tiozinhos aposentados ingleses dando uma voltinha pela America do Sul em um Swan 52 com um jogo completo de catracas eletricas. Assim eh facil, diria provavelmente Slocum.

Mas nao sao soh veleiros que fazem parte da populacao de viajeros de Ushuaia. Assim como em Punta Arenas, ha um cybercafe em cada esquina, mochileiros abundam, assim como endinheirados que param por aqui em seus mega cruzeiros antarticos. O que me surpreendeu, no entanto, foi um caminhao estacionado perto do Afasyn, um Unimog com uma familia inteira de franceses lah dentro, inclusive um bebe de colo. Estao dando a volta ao mundo, na metade da etapa America Latina. Il reste encore l'Afrique...

Ah...o bicho-da-viagem...

Noite do dia 12. Grito de Carnaval no Fim do Mundo

Bate culo, bate culo...

E o Funk Carioca chega até o Fim do Mundo...

23 fevereiro 2006

Dias 10, 11 e 12. O Velho Corsário.

It figures. O dia que vou embora é o dia que faz o melhor tempo...muito sol, muitas fotos panorâmicas, um papo amigo com uma foca de weddel e um quase tropeço (literalmente) em uma foca caranguejeira. Após a cerimônia de passagem de funçao ("Eu ASSUMO"...uia!), embarquei no Ary Rongel para a lendária Passagem do Drake.

A zona de alta pressao que mencionei antes se estabilizou sobre o Drake, criando o "Drake penteado": condiçoes estáveis, tempo bom, ventos e ondas vindo sempre da mesma direçao. No caso, pegamos o vento e as ondas de través. Força 5, quase 6, 20 nós, ondas de dois a cinco metros. Fichinha para o Drake, mas o navio estava muito leve devido à descarga de óleo para a Estaçao e balançava muito. Claro que mareei, vomitei pouco, mas o desconforto era constante, nao dava disposicao para nada, nem para comer. O Spa Ary Rongel, faça uma passagem pelo Drake e emagreça. Andava constantemente com um saquinho plástico no bolso para emergências. Para meu consolo, quase todos passaram mal, uns mais, outros menos, com exceçao dos veteranos.

Todo mundo se pergunta como astronautas fazem para ir ao banheiro no espaço. Bobagem. Gravidade zero e aspirador de pó. Pergunte-se como sao realizadas as funçoes de higiene mais banais em uma passagem do Drake. Isso sim é aventura. Mijar no Drake é como mijar do alto de um brinquedo de parque de diversoes. Tomar banho, só ricocheteando nas paredes, tomando cuidado para nao se queimar no aquecedor. Nao tive coragem de fazer a barba, poderia cortar alguma artéria. Imagine-se dormindo sobre uma gangorra com duas crianças gordas e sádicas nas pontas e terá uma idéia de como eu dormi.

Mas isso foi só nas primeiras 24 horas, depois nao mareei mais. Esqueçam dramin e vertix, o melhor remédio para enjôo é encarar o balanço, dançar junto e tentar dormir, passei um bom tempo na cama acostumando meu labirinto. Ontem subi ao passadiço, como se nunca tivesse enjoado na vida, para assistir um pôr-do-sol espetacular - sol descendo no mar, mar sem fim à minha volta, somente algumas pequenas aves por testemunha. E eu fico me perguntando como elas fazem para chegar aqui e por que, por que...

O Drake é uma lenda. Junto do Cabo Horn, é o equivalente ao Monte Everest do marinheiro. Há almirantes que nunca fizeram a passagem e me dá um senhor orgulho de ter sido minha primeira travessia - o Drake nao me fez abandonar meus planos de vela, só fez reforçar.

Hoje de manha estávamos já no Canal de Beagle, lindo de verdade, quase tao selvagem quanto da vez que Fitzroy e Darwin aqui estiveram. Passamos pelas ilhas da discórdia entre Chile e Argentina. Uma baleia deu as caras, mas eu infelizmente perdi o espetáculo. Atracamos antes do esperado, havia até uma bandinha militar para receber o Ary Rongel. Fizemos a travessia em pouco menos do que 50 horas, desenvolvendo velocidades entre 10 e 13 nós.

E aqui estou, no fim do mundo, Ushuaia.

21 fevereiro 2006

Dia 10. One post for the road

Caiu a ficha que vou embora e bateu uma tristeza...um banzo precoce, como se eu estivesse deixando uma namorada para trás. Ao mesmo tempo, uma hesitação pelo que (eu não sei o que) vem pela frente.

Ontem segui o alpinista até a "Casinha do Cachorro", um morro atrás da Estação que proporciona uma vista fantástica da Enseada McKellar e da Baía do Almirantado. Há muitos ninhos de skuas por lá, o vento forte permitia que elas ficassem paradas a poucos metros sobre nossas cabeças sem bater as asas. Alguns minutos sentados quietinhos e elas não mais nos viam como ameaça. Fotos, fotos até perder a sensação dos dedos. Eram umas 18h e o sol resolveu dar as caras. Um presente de despedida desta ilha onde a luz é sempre ofuscante, mas o sol quase nunca aparece. Como se fosse uma ilha da ficção, sempre coberta de nuvens, inexplorada, invisível a olhos eletrônicos (o quanto da Antártica é parte de nosso imaginário?).

Foi-me dito que não é a melhor época para vir, o fim do verão, os animais migratórios já se mandaram em sua maioria, fim de temporada, sem projetos de pesquisa para acompanhar, apenas fainas de carga entre o Ary Rongel e a Estação. Bobagem, quem me conhece sabe que estou em êxtase só por estar aqui. Tive oportunidade de excursionar pelos arredores de Ferraz, acompanhar o dia-a-dia da Estação e conhecer muita gente que dedica anos de sua vida ao Programa Antártico Brasileiro.

Passar longos períodos aqui é difícil, mesmo com todo o conforto e os recursos para comunicação. Para ficar nesse isolamento, não é só necessário ter uma boa relação com os colegas, mas, principalmente, é vital estar bem consigo mesmo, "Ponto Nemo". Quem se sujeita a isso precisa ser gente boa para aturar a si mesmo nessas condições, e eu só conheci pessoas bacanas aqui.

Embarco em poucas horas para encarar o "Velho Corsário". A zona de alta pressão parece ter se firmado e esperamos uma travessia tranqüila.

O próximo post só em Ushuaia, daqui a uns 4 dias. Até lá.

20 fevereiro 2006

Dias 8 e 9. Enseada McKellar, Estação Arktowski e Xixi de Bisão

Vento nos 10 nós, temperatura 0°C-5°C. Hoje a Estação está em compasso de espera, fim de temporada. Uma missa será celebrada em alguns minutos. Amanhã de tarde há a cerimônia de passagem de função do Grupo Base 2005-2006 para o 2006-2007, logo depois o Grupo Base antigo embarca no Ary Rongel, assim como eu, e seguimos para Ushuaia. Todos têm alguma coisa de última hora para fazer, algo a aprender, algo a ensinar, muito a organizar.

A partir de amanhã devo ficar incomunicável no Ary Rongel até a chegada em Ushuaia, prevista para dia 24. Estamos torcendo para que nossa passagem pelo Drake coincida com uma zona de alta pressão que está estacionada no Pacífico, em meio a diversas pequenas zonas de baixa. Isso significa que, com sorte, teremos tempo bom, mas estamos arriscados a pegar pancada pela frente. E pancada no Drake significa ondas do tamanho de edifícios. Dá-lhe Vertix!

Ontem foi meu dia mais bacana. Saí sozinho logo depois do café, me aproximei devagarinho de um pequeno grupo de pingüins em frente ao heliponto da Estação e fiquei lá, trocando uma idéia, tirando umas fotos. Logo depois, me juntei a um grupo de 22 pessoas que seguiam o alpinista em um passeio no dia de folga para a Enseada McKellar, ou seja, subir a costa oeste da península toda, além do Refúgio Ipanema. Por todo o caminho, skuas e trinta-réis (parece uma andorinha) agressivos faziam vôos rasantes para nos afugentar das proximidades de seus ninhos. Na ida, topamos com um pouco amistoso leão marinho, na volta, uma foca de weddel, tão tranqüila que quase passei por ela sem ver, descansava sua descomunal massa de banha. O ponto alto, no entanto, foi a Enseada. Bastante abrigada, não havia brisa nenhuma, enquanto batia uns 20 nós na Estação. O dia estava cristalino, conseguíamos ver toda a Baía, inclusive as estações Machu Pichu (peruana) e Arktowski (polonesa), bem longe.

Uma enorme geleira caracteriza a Enseada McKellar, Geleira Domeyko, em tons de azul que não consigo reproduzir na máquina fotográfica por ausência de filtros na lente, quanto mais descrever. Ouvíamos estrondos pavorosos, trovões deslocados naquele tempo bom. Era a geleira, parecia viva, toneladas de gelo rachando, se compactando, se deslocando e causando os trovões, de vez em quando caía um bloco na água e momentos depois o choque criava uma longa onda perto de nós. Consegui filmar a queda de um bloco enorme (tenho mais ou menos 1,5 Giga de fotos e vídeos até agora)

Depois do rancho na Estação, segui com o Comandante e outros até a Estação polonesa, Arktowski. Botamos a roupa laranja, embarcamos nos zodiacs e atravessamos a Baía inteira, Wipe out tocando no oereworm. Lá fomos recepcionados com a bebida típica, Charlotka (algo como "torta de maçã") - suco de maçã e uma vodka especial chamada Zubrowka. A Zubrowka é feita com extratos de um capim típico da Polônia e que era a principal refeição dos bisões, dizem que é o xixi do bisão que dá o gostinho. Um tesão de bebida, podem anotar: Zubrowka.

As relações entre Ferraz e Arktowski cresceram bastante nessa temporada que termina amanhã, em parte graças aos esforços do Chefe em Ferraz, em parte porque um oficial brasileiro namora uma pesquisadora polonesa. Os brasileiros adotaram a Zubrowka, os poloneses aprenderam a fazer caipirinha.

Arktowski foi talvez o primeiro pesquisador antártico polonês, integrante da Expedição do Belgica, liderada por Adrien de Gerlache, a primeira invernagem antártica (onde também estava um certo norueguês que viria a ser o pesadelo de britânicos, Amundsen). Gerlache "esqueceu de avisar" sua tripulação que planejava invernar na Antártica, durante a longa noite de inverno, muitos, literalmente, piraram e por pouco a expedição não terminou em catástrofe.

A aconchegante estação amarela da Polônia está localizada na beira da Baía. A vista espetacular compensa o fato de que o lugar não é tão bem abrigado quanto Ferraz. Há pequenas ondas na praia de cascalhos, o que dá um efeito sonoro gostoso, primeiro ouvimos o barulho da onda quebrando na margem, depois o barulho da água escorrendo entre os cascalhos.

Arktowski tem muita vida selvagem, fica ao lado de uma pingüineira. Mesmo os bichinhos tendo migrado há algumas semanas fugindo do inverno que se aproxima, ainda dá para sentir o fedor do lugar. Passeando pelos arredores acompanhado de um local, vi a última espécie de pingüim da Baía do Almirantado que me restava, alguns jovens adélies em troca de penas, feios de dar dó, e que por isso ainda não migraram.

Mas o grande barato de Arktowski são os elefantes marinhos. Toneladas inertes de gordura preguiçosa, ficam parados por dias sem sair do lugar, mal se pode distingüi-los de pedras, apenas quando abrem os enormes olhos. Chegam a servir de substrato para líquens. Como não têm nenhum predador em terra, permitem que a gente se aproxime muito, o tanto que nossos narizes permitirem. Havia por lá também um solitário filhote de lobo marinho a posar para fotos.

Arktowski tem um programa completamente civil, então eles têm que dar um jeito de complementar o caixa dando apoio para navios turísticos e vendendo souvenirs. Ao entrar na lojinha, há duas enormes pedras com caras etiquetas de preço. Uma piada ótima, se olharmos pela janela, há pedras por todos os lados. Mas deve ter algum turista japonês que caiu nessa já... Comprei a camiseta mais cara de minha vida, não há muita concorrência por aqui.

De volta à estação, mais Zubrowka. Zodiacs, de volta a Ferraz, mais Zubrowka. Hoje, dor de cabeça.

Se não voltar a postar até lá, nos falamos em Ushuaia.

oooO*Oooo

Piada pronta

Os oficiais médicos na marinha recebem a alcunha de "Doc". A especialidade do novo "Doc" da Estação é proctologia. O "Doc" é "Proc" e fica andando com o dedo em riste por aí, ameaçador.

Enquanto o próximo post não vem....


...fiquem com uma foto deste lugarzinho feio...

18 fevereiro 2006

Dias 5, 6 e 7. Ossadas, pingüins, whisky e churrasco

Baleia de CosteauMuito tempo sem postar, muito a relatar, muita coisa acontecendo aqui e no Brasil.

Os arredores de Ferraz são repletos de ossadas de baleias, mortas no auge da indústria baleeira, quando as águas antárticas ficavam, literalmente, vermelhas com o sangue dos animais mortos para virar óleo, sabão, perfume, pentes e explosivos. Os mais impressionantes são as vértebras, aos montes, convenientemente espalhadas para assento dos transeuntes enquanto admiram a vista. São igualzinhas vértebras humanas (fala um herniado, que entende do assunto, portanto), só que do tamanho de uma mesa de centro. Jacques Cousteau, em visita à Ilha do Rei George, montou o esqueleto da foto acima, que hoje repousa em seu leito de líquens e serve de ninho de skuas (que me impediram de me aproximar para ver melhor). Mas não seria difícil montar muitos outros esqueletos completos.

Há três espécies de pingüins na baía do almirantado: adélie, papua e antártico.

Travei contato com exemplares das duas últimas. São realmente engraçados, tudo o que a música da "Arca de Noé" diz. Curiosidade: suas fezes são vermelhas, devido à presença de krill em sua dieta. Você está andando pela praia, vê uma pedrinha diferente dos demais cascalhos, vermelhinha....é bosta congelada.

Voltei a bordo do Ary Rongel, onde houve a festa de aniversário de um oficial, quando aproveitaram para fazer uma pequena solenidade para me dar as boas vindas. É notável as semelhanças entre a conduta cerimonial da Marinha e do Itamaraty - com a diferença de que eles são muito mais sérios. Nunca tinha convivido por tanto tempo com milicos. É impressionante como a mentalidade militar é preto no branco, não é um maniqueísmo tolo, mas a convicção de estar fazendo algo correto. É reconfortante saber que há pessoas tão comprometidas com ideais e com a coletividade quando tudo que me resta é esse niilismo individualista. Saio daqui com as melhores impressões da Marinha. Ary Rongel

Na noite do dia 16/2 o vento subiu para 40 nós. Dá para sentir o navio vibrando, ouvir o vento forte do lado de fora. A lua permitiu ver os carneirinhos marombados ao redor do navio, chovia de baixo para cima. De assustar. Um marinheiro me disse que no inverno o vento bate nos 90 nós. A voz de Deus. E o que ouvi naquela noite foi só o sussurro.

Mas ontem o dia amanheceu como se a Baía do Almirantado fosse o Lago Paranoá, um espelho. Almoço com o Comandante do Navio mais o atual e o futuro Comandante da Estação. Cardápio: Feijoada. Regada a Chivas com gelo antártico, repleto de bolhas de ar centenárias, que fazem barulho à medida que o gelo derrete.

Voltei à Estação e saí batendo perna com o alpinista pela costa oeste da península onde está Ferraz. Mais ossos de baleia. E mais outros. E pingüins preguiçosos e skuas agressivas. Paramos no abrigo de um cientista na Punta Plaza, a beirinha da península, para tomar café. Estava um dia lindo, sol, fazia calor até. Até que dobramos a Punta Plaza e passamos a encarar de frente um vento de uns 20 nós, o que nos obrigou a vestir o "brucutu", aquele gorrinho que deixa só os olhos de fora. Não pelo frio, mas pelo vento. Fomos até um refúgio chamado sarcasticamente de "Ipanema". Ary Rongel

Uso um daqueles óculos cujas lentes reagem à radiação ultra-violeta, escurecendo. Não deixo de ficar impressionado com o tanto que as lentes ficam negras aqui, mesmo que o sol não esteja dando as caras. O buraco de ozônio logo acima de nossas cabeças.

Na volta, estava rolando um churrascão na Estação. Desceu o pessoal do navio, inclusive pesquisadores búlgaros que vão pegar uma carona para Ushuaia. Cerveja rolando solta, gelada com blocos de gelo naturais, o alarme de incêndio desligado por causa da fumaça da churrasqueira. Um búlgaro trouxe um violão. Logo estava acompanhando os pagodeiros. O sambão comendo, mesmo sem haver uma palavra sequer em um idioma comum, búlgaros e brasileiros tocando juntos, samba e polca (ou algo que parecia uma polca). Conhece a piada do búlgaro que estava sambando em um churrasco na antártica? Insólito.

Hoje a manhã foi dedicada a uma faxina geral. Lá foi o diplomata com a peãozada do Arsenal da Marinha limpar a carpintaria da Estação. Não fiz feio, mas estou certo que tenho que agradecer a cada instante por ter passado nesse concurso...

Almoço: Rabada. Quanto será que já engordei aqui?

De tarde choveu intermitentemente. Temperatura por volta dos 5°C, vento nos 10 nós, sensação térmica de -5°C. Aproveitei uma brecha, parecia que o tempo tinha firmado, recebi autorização e voltei lá para a Baleia de Costeau para tirar fotos. Ficaram ótimas, o sol saiu, a luz estava ideal. No caminho de volta, visitei o Morro da Cruz, onde há 4 cruzes em homenagem a pesquisadores britânicos que morreram nessa região e uma cruz para Alberto Poppinger, do Programa Antártico Brasileiro, que faleceu aqui em 1990 em decorrência de um ataque cardíaco. O passeio todo não durou mais do que meia hora, mas aquele sol todo virou uma chuva fina, fria, horizontal, com uma rapidez que nunca vi. É a Antártica. Aquela caminhada morro abaixo me fez lembrar de todos os relatos sobre exploração polar que já li e ficar ainda mais admirado, in awe.


O mundo muda
A gente muda
O mundo muda
A gente muda
O mundo muda
Karnak

16 fevereiro 2006

Dia 5. Prova factual.

Para que minhas constantes postagens não gerem dúvidas quanto à minha presença em terras austrais, segue abaixo a prova factual dela.






PS: Hoje vi pingüins.

15 fevereiro 2006

Dia 4. Ferraz

Fim de noite de 15/2. Tanta coisa acontece e são tantas horas de luz por dia que eu tive que checar minhas anotações para saber se este era o dia 4, 5 ou 6 da viagem.

O tempo não colabora muito, tudo encoberto, 0°C com sensação térmica por volta de -10°C devido ao vento entre 10 e 15 nós, com rajadas de ventos cataclísticos (que eu conhecia na literatura polar como willywaws) - pancadas fortes e curtas, imprevisíveis, que descem das regiões mais elevadas pelas geleiras (no caso aqui da Geleira Stenhouse e da Barreira Ajax, em frente à Estação, do outro lado da baía), fenômeno que ocorre na Antártica e na Patagônia. Mawson, o explorador australiano, acreditava que acontecem simplesmente pela ação da força da gravidade, uma avalanche de ar frio descendo encosta abaixo. Se non è vero, è ben trovato.

O pessoal no Rongel é super simpático, o ambiente muito mais informal do que eu esperava, mas dá para perceber que eles já estão de saco cheio disso aqui e querem voltar logo para casa. Esse espírito contrasta completamente da empolgação do paisano aqui, que fica enchendo a paciência deles no passadiço tirando fotos. Já tirei mais de 100, tive que dar uma editada nas piores para poupar o chip. Ferraz fica na parte norte da Baía do Almirantado, caracterizada pelas geleiras mencionadas acima e por montes negros de 100-200 metros da mais negra rocha vulcânica, muito porosa devido às temperaturas extremas.

Não há muito o que fazer no navio, então na primeira oportunidade embarquei em um zodiac (bote inflável) para Ferraz. A temperatura da água fica em torno de 2°C, o que dá mais ou menos 90 segundos de vida para o pobre paisano que cair na água, por isso é necessário vestir por cima da jardineira e do casaco, com bota e tudo, uma roupa especial inflável e semi-seca (ie, não completamente vedada) da cor "laranja-mamãe-não-me-perca-na-neblina", as Mustangs. Parece que você vai desembarcar na Lua, não na Antártica.

Desembarque em Ferraz

Nenhum pingüim à vista, mas me prometeram alguns assim que melhorar o tempo. Somente uma Skua, uma ave de rapina cinza que parece uma gaivota mal encarada. Desembarquei na praia pedregosa da Estação Antártica Comandante Ferraz, aproveitando a carona do Chefe de Operações que veio checar dados para uma "faina" de carga e descarga.

Com o link da Telemar por satélite, que possibilita ligações VoIP para o Brasil como se fosse do PABX da Marinha no Rio de Janeiro, o pessoal da tripulação aproveita também qualquer oportunidade para vir para fazer um 21 para a família (21, 31, entendeu? dããã). Isso dá um gás para o pessoal que fica longos períodos aqui. Liguei a cobrar para meus velhos, será que vai sair caro? Enquanto teclo, há um pessoal vendo o jogo do Vasco em um telão, tudo graças à anteninha da Telemar.

(Disclaimer: não recebo jabá da Telemar)

Em Ferraz, acompanhei o Chefe da Estação enquanto dava o tour para seu sucessor no Grupo Base que chega. Dos 8 módulos (containers) originais de 1982, Ferraz cresceu para mais de 60 módulos, atualmente em reforma para interligar os módulos existentes em uma construção só e agregar mais alguns espaços. Pode dar a impressão de se estar em um navio em alguns momentos, mas o conforto é infinitamente superior. Fiquei bastante impressionado, surpreso até, com o conforto das instalações. As partes de convivência comum têm acabamento em madeira, o que é sempre agradável, a temperatura é mantida para ficar de camiseta, os camarotes são espaçosos o suficiente para permitir que duas pessoas não se matem. A Marinha conserva isso aqui com uma competência e um zelo de encher os olhos.

Na Estação me sinto mais à vontade, com o pessoal que conheci no percurso de avião. Fui promovido, virei o "Senhor Embaixador", algumas vezes sou o "Merré" (MRE). Todo mundo sabe que sou um nada hierárquico, mas o apelido pegou. Agora, o engraçado é que aparentemente tem gente que não entendeu que é um apelido.

Saída da Estação

Deve ter gente pensando que essa viagem é um hoax...."pô, esse cara diz que foi para a Antártica mas fica um tempão no messenger e blogando. Deve estar na praia no Rio". Para sair da Estação, é necessário estar acompanhado de um alpinista do Clube Alpino Paulista, que tem uma parceria com o Proantar para assessorar os militares e pesquisadores. No Brasil, quem entende de andar pelo gelo são eles, e graças a essa parceria o Proantar nunca perdeu alguém na Antártica, as ocorrências mais graves foram umas fraturas e um ou outro ataque cardíaco. Assim que o alpinista estiver liberado, vou bater perna por aí. Enquanto isso, fico aqui como se estivesse no escritório....blogando, blogando....


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Piada de corno

Tocar instrumentos musicais parece pré-requisito para fazer parte do Grupo Base que assumirá a próxima temporada. Os caras vieram com um verdadeiro arsenal musical, violões, contra-baixo elétrico, estúdio portátil, etc. Diante da preferência musical de alguns por músicas sertanejas, o alpinista comentou "Pô, só tem música de corno, meu!". A resposta de um oficial: "Por que você acha que esse povo vem pra cá....?"




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Nota escato-ecológica

Dei um cagãozinho na Estação. Ele será devidamente acondicionado e congelado, para depois retornar ao Brasil, de acordo com as normas estabelecidas no Protocolo de Madri. Bostex internacional.

14 fevereiro 2006

Dia 3. Chegada.

Garota, eu ESTOU na Antártica.
 
A Estação Comandante Ferraz tem, desde esta temporada, uma antena para transmissão em banda larga, o que possibilita ligações para o Brasil, VoIP, e uma rede Wi-Fi que chega até o Ary Rongel quando este está fundeado na Baía do Almirantado, de onde envio estas linhas.
 
Considerando que Punta Arenas é uma cidadezinha no fim do mundo, até que sua segunda feira é bem agitada. Depois do pôr-do-sol às 22h, pub-hopping, pisco-sour e empanaditas. Muitos mochileiros e pesquisadores de programas antárticos pela rua. À tarde, segui as orientações de uma vendedora de souvenirs e fui atrás de um antigo buque inglês que encalhou no (largo) Estreito de Magalhães (dãããã). Acabei indo parar em uma área nada charmosa da cidade, local bem pobre, completamente fora dos mapas turísticos. Peguei um táxi na volta, tarifa fixa 300 pesos. Qual não foi minha surpresa quando o motorista parou em uma esquina para pegar mais passageiros. Aí me dei conta que não tinha visto sequer um ônibus na rua: todo o transporte coletivo em Punta são táxis-lotações.
 
Alvorada às 07h00 para decolar somente às 11h. Dia cheio na Estação Chilena Presidente Frei, três aviões chegando. Duas horas e meia de vôo sobre o oceano austral, pousamos. Insano de vontade de fazer xixi, quase não consigo aproveitar o desembarque (o banheiro químico do Hércules foi desmontado). Muita pedra e muita lama, uma neblina insistente e uma neve fininha (slush, chamavam na DK), daquelas que derretem assim que encostam em algum lugar, só servem para deixar a roupa molhada. Temperatura por volta de 0, sensação térmica puxando para os -10 graus, devido ao vento  (entre 10 e 15 nós) e à névoa. Essas condições perduraram por todo o dia.
 
Fomos até a "praia", vestimos as roupas especiais para transporte aquático (um homem sobrevive até cinco minutos nessa água sem roupas especiais), embarcamos nos zodiacs e seguimos para o Ary Rongel escoltados por duas aves (comodoros, creio. Mas podiam ser marrecos também que eu não saberia dizer) voando bem pertinho, à altura de nossas cabeças.
 
Fomos muito bem recebidos a bordo pelo Comandante Parente e o Imediato Costa Nunes, estou muito bem instalado em um camarote em frente à Praça de Armas (onde os oficiais rancham). O navio joga bastante, mas eu, que enjôo até em rede, estou tranqüilo graças às minhas doses diárias de Vertix. Salve o Ricardo que me apresentou ao Vertix, Dramin nunca mais!
 
O Ary Rongel está equipado com todas as comodidades para longos períodos isolados (ie, TV, DVD, som, etc) e o ambiente é mais informal do que eu imaginava. Vou evitar o clichê "família", mas dá para sentir a camaradagem do pessoal da Operação Antártica, gente que vem para cá ano após ano - o velho e bom conhecido bicho-da-viagem, provavelmente.
 
Nesse exato instante estão terminando o desembarque do pessoal que vai ficar em Ferraz, eu permaneço no navio até a próxima oportunidade de desembarque. Enquanto isso, passo bastante tempo na ponte de comando, onde tem a melhor vista, tirando fotos e babando na geleira, a estação lá longe, 60 containers verdes. A luz está uma bosta e as imagens, idem, mas não consigo deixar de apertar o botão da máquina.
 
Até a próxima.

Dia 3. Punta Arenas. Aguardando embarque.

I AM GOING SOUTH PT

CAMBURIZINHO PT

13 fevereiro 2006

Dia 2. Punta Arenas.

Viagem tranquila. Tres horas no Hercules para chegar a Pelotas e hoje mais 6 horas para chegar a Punta Arenas. O unico temor, verdadeiro panico, era o risco de perder o voo por conta de nao ser acordado no hotel.

Viajar de Hercules eh bastante desconfortavel, especialmente para alguem com quatro parafusos de titanio nas costas, mas eh melhor do que BRA e Gol. Somos por volta de 50 pessoas: alguns pesquisadores, um alpinista do Clupe Alpino Paulista (que assessora o pessoal na EACF, gracas a isso o Brasil nunca perdeu alguem na Antartica, salvo por ataque cardiaco), o Grupo Base que rendera o atual pessoal na Estacao pelo proximo ano e engenheiros e tecnicos do Arsenal da Marinha que darao continuidade as reformas na estacao.

Em Pelotas (eita lugarzinho feio), a Estacao de Apoio Antartico da UFRG nos deu a andaina (aquele saco que faz as vezes de mala para marinheiros) com a roupa antartica - verdadeiro arsenal contra o vento e o frio, bastante intimidador.

Punta Arenas me lembra um pouco Hobart. Nao soh pelos carros aqui serem os mesmos carros orientais da outra margem do Pacifico. Ambas as cidades tem aquela coisa de altas latitudes, espacos muito amplos, a luminosidade de um jeito diferente que nao consigo explicar, ventos cortantes arrastando curiosas formacoes de nuvens a altas velocidades. Parece que o teto eh mais baixo, mas o vao livre eh maior.

Nao tive tempo de fazer nada ainda, vim direto para o cybercafe checar email e tomar cafe assim que sai do hotel. O grupo foi para a Zona Franca, mas eu preferi bater perna (terei outras oportunidades de ir ao duty free no retorno por via comercial).

Venho lendo um livro de E. Lucas Bridges em sua edicao argentina, Os ultimos confins da Terra, sobre os primeiros estabelecimentos de missionarios ingleses na Terra do Fogo. Fantastico, recomendo. Achei, portanto, que estava com o portunhol afiado, mas foi dificil encontrar "el cajero automatico" - um tanto frustrante.

Me voy. Tenho que descobrir se o embarque para a Ilha do Rei George amanha foi confirmado.

10 fevereiro 2006

Garota, eu vou para a Antártica

Caixa de entrada no trampo vazia.

Passagens emitidas.

Meu cão é despachado hoje para Santos.

Roupas e botas novas compradas. Mala (mentalmente) pronta. Vou tirar a poeira do mochilão.

Amanhã eu embarco para o Rio, de lá um Hércules C-130 me leva para a Antártica. Ilha do Rei George, arquipélago das Shetland do Sul, Estreito de Bransfield.

Garota, eu vou para a Antártica. Volto à América de navio pela Passagem de Drake. Carnaval em Ushuaia (alalaô ôôô ôôô, mas que calô ôôô ôôô). Terra do Fogo e Cabo Horn. De lambuja um fim de semana na balada em Buenos Aires. Um mês fora no total (tentarei postar, mas não sei quando terei acesso à internet - de qualquer forma faço um relato completo depois).

Ainda não caiu a ficha. Vou realizar o sonho de uma vida antes dos 30 anos. Depois dessa viagem, terei que achar uma nova obsessão ou me tornarei uma versão daquela crônica do Veríssimo, sobre o homem que atingiu a perfeição e depois passou a vida calado, sorrindo para o vazio com um jeito sacana, bolinando o gelo no whisky.

Garota, eu vou para a Antártica.


ps: frase do meu velho quando eu contei sobre minha viagem "Olha, leva agasalho, filho..."

05 fevereiro 2006

Pois há muito o que celebrar neste mês...

04 fevereiro 2006

Quadrilha pós-moderna (A fila não só anda, como se entrelaça)

João amava Teresa que antes namorava José e hoje namora Raimundo que é amigo do João que hoje tem paixão por Maria mas que depois de Teresa amou Lili que casou com J. Pinto Fernandes que não tinha entrado na história. Maria tinha um caso com Eustáquio que ama na verdade José e é correspondido.

E todos estavam na mesma festa ontem.

03 fevereiro 2006

Surto de produtividade

Tio Alex voltou a mencionar uma matéria antiga do The Onion, 48-Hour Internet Outage Plunges Nation Into Productivity.

A piada é mais ou menos essa: sem Internet as pessoas passaram a usar os computadores do trabalho para trabalhar de verdade, ao invés de passar o dia em blogs, emails, etc.

Atesto a veracidade da matéria. Este barnabé, temporariamente cedido a outra unidade onde não dispõe de sala própria, atualmente dividindo o ambiente de trabalho com outros dois colegas, se encontra em um surto de produtividade nunca visto, e até que está gostando.

Agora dá licença que eu preciso trabalhar.