03 maio 2006

Che

Não, este post não é sobre o revolucionário protagonista de um filme de Walter Salles. Sobre ele, acho que a Argentina perdeu um bom médico e o mundo ganhou uma camiseta feia.

Me refiro à importância do che na comunicação local. Palavra de origem obscura, me disseram por aqui que significa "gente" em mapuche, língua de algumas das dizimadas tribos aborígenes que habitavam entre os Pampas e a Patagônia.

Não é exatamente o tchê dos gaúchos brasileiros, que (tenho a impressão, algum gaúcho certamente me poderá corrigir) é mais usado como interjeição, geralmente ao final da frase, ou mesmo no meio como no exemplo Bah, tchê, que eu gosto.... O che é um vocativo, início de 9 em cada 10 frases porteñas. Talvez o analogamente mais próximo no Brasil seja o Ô-ô goiano, mas este não é tão difundido.

Eu queria uma moeda por cada che que ouvi. Che, me bastaria uma moeda para cada che que falei, a expressão vicia e quando você se dá conta, já é o vocábulo mais usado. É também ótimo para dar início a um papo com quem você não conhece ou não lembra o nome.

Imagino um conto, deixo para que os fãs de Borges o escrevam, sobre um dia sem che na Argentina, seja por decreto ou por razões fantásticas. Os nativos teriam sua capacidade de comunicação seriamente afetada. Ninguém conseguiria começar uma conversa informal, ficariam reduzidos a formalismos arcaicos ou se renderiam à linguagem de sinais. Teriam que chamar a atenção uns dos outros com gemidos grotescos ou tapinhas nos ombros, o que, dependendo da duração e intensidade, poderiam levar a tapas raivosos e grunhidos de dor. Casamentos seriam arruinados por falta de comunicação. Uns tantos outros seriam salvos, é verdade. Sem comunicação eficiente, ordens não poderiam ser cumpridas. As Forças Armadas entrariam em colapso. Os serviços mais básicos deixariam de ser prestados por simples falta de comunicação entre comprador e vendedor. A bolsa cairia, o dólar subiria, uma fuga de capitais sem precedentes acompanharia a subversão de qualquer regra de mercado que pressuponha alguma simetria de informação. Seria o caos, o desmantelamento do tecido social. Milhões de pessoas finalmente sairiam às ruas em panelaços nunca vistos, exigindo a volta do bendito monossílabo. Che, estaria buenísimo

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