08 abril 2006

Supermercado: mau humor e descrença financeira

Eu detesto supermercado, detesto fazer compras. Quando eu era criança e ir ao supermercado significava uma visita à seção de brinquedos enquanto meus velhos se esforçavam para montar um estoque que durasse até o próximo salário, comido minuto a minuto pela inflação, eu até gostava, com um pouco de manha dava para sair de lá com um brinquedo novo.

Hoje supermercado é sinônimo de muvuca, gente se trombando, filas e mais filas, velhinhos pagando suas contas com tickets alimentação, cupons de desconto e moedinhas, crianças pentelhas chorando porque querem um brinquedo novo...insuportável.

Não bastasse isso, me dei conta enquanto escolhia uma manteiga hoje que é muito mais difícil fazer compras no exterior. Já vivi fora, mas era pós-aborrecente, sempre morei na casa de alguém que se encarregava de materializar as coisas na geladeira. Minha ojeriza a supermercados fica aqui potencializada porque não tenho a mais puta idéia de quais produtos são melhores, perdi as referências de marcas e preços que tinha - qual manteiga aqui equivale à Aviação?

E isso em uma língua deveras parecida ao português, imagino a pedra de roseta que seria necessária para missão semelhante em terras mais exóticas. Mesmo os abundantes produtos do imperialismo brasileiro são levemente diferentes, não sei como depois de tantos anos vou me acostumar a escovar os dentes sem minha pasta Colgate com Bicarbonato.

É o jeito. Ou aturar isso ou viver de empanadas e bifes de chorizo. Se bem que não seria tão mal...

Um comentário paralelo para o pequeno estudante de economia que existe em você. Nesta minha ida ao supermercado tive uma demonstração interessante da falta de credibilidade dos argentinos no sistema financeiro. Depois de tantas crises, especialmente a da desvalorização de 2001, os boludos preferem colocar o dinheiro sob o colchão do que em algum banco.

O supermercado (que, necessário dizer, não fica em uma zona turística ou diplomática) aceita pagamentos em dólares e euros, na boca do caixa, sem burocracia, a uma taxa muito camarada, melhor até que a maioria das casas de câmbio. Agora, para pagar com meu cartão de crédito, foi um fuzuê, queriam documentos, o diabo a quatro.

Isso é tópico para o Freakonomics ou o De Gustibus, o empresário argentino prefere arcar com custos de transação de uma moeda estrangeira e correr o risco de receber notas falsas a ser pago por meio de uma transação eletrônica, em tese mais segura e, suponho, com custos de transação mais ou menos equivalentes. E encontra plena aceitação do consumidor.

A representação contábil de sua vida material, ie. tudo que você leva na carteira, depende que outra pessoa acredite que vale o quanto você diz que vale. Em última instância, cartões de plástico e dinheiro têm o mesmo valor de um pedaço de papel de embrulhar pão escrito "Vale...". Não se chama "crédito" à toa. É uma obviedade, mas não deixa de ser assustador verificar que todo o sistema capitalista se baseia na confiança entre seres humanos, essa gente de pouca confiança.

4 comentaram:

Victor disse...

Você não enjoou do bife de chorizo? Eu passei uma semana aí e já implorava por comida "normal".

Lucia Malla disse...

"(...) imagino a pedra de roseta que seria necessária para missão semelhante em terras mais exóticas."

Tell em about it... Ateh hoje ainda me pego levando pra casa coisas erradas/ desnecessarias, como vidros que acho sao de chah de limao e chega em casa percebo q eh de casca de uma arvore estranha ou algo q o valha. Fora material de limpeza. E fora a sessao de hortifruti, onde 50% dos produtos eu nunca vi na vida (uns cogumelos e uns vegetais estranhos). Eh uma diversao, de certa forma. :-)

Anônimo disse...

Fipe, considerando a potência agropecuária que é a Argentina (hahahahahaha) imagino que praticamente qualquer manteiga daí dá uma surra na aviação...

mas o chocolate da Arcor é um LIXO!!! Fuja dele...

Thaty disse...

Acredite se quiser, me senti do mesmo jeito quando fui morar em Natal, há uns 10 anos. Criada em Brasília, me senti em outro mundo: marcas totalmente diferentes (regionais), frutas "exóticas", pratos que eu nunca havia ouvido falar. Sorte que me apaixonei pela maioria deles (hehehe) e em 2 meses já era quase uma "potiguar".

Hoje em dia, de volta à Bsb, amo ir ao supermercado. Não me pergunte o porquê: é uma paixão inexplicável, já que não sou do tipo que ama fazer compras de qualquer outra espécie. Até sei o melhor horário para não pegar fila: segunda-feira, após às 22 horas. Acho que preciso me tratar...rsrsrs